UM DESAFIO PARA TODO O SISTEMA
O uso inadequado de medicamentos ou qualquer outro tipo de droga, no transporte aéreo, é uma preocupação perene para as autoridades e os operadores do setor.
Por esta razão, certas instituições de classe, como a IFALPA, International Federation of Air Line Pilots Association, a qual representa mais de 100 mil pilotos em todo o mundo, encorajam um ambiente de Aviação Civil livre do uso de substâncias consideradas problemáticas. Entretanto, independente da ambiência, sempre há ou haverá alguém desenvolvendo o uso desses tipos de substâncias, seja por problemas de foro pessoal, seja pela pressão social que a vida contemporânea exerce sobre os indivíduos, ou por ambos.
É do conhecimento geral que quanto mais cedo se reconhece e se trata esse tipo de problema melhor será o resultado final obtido. Corroborando com esta afirmação, todos sabem que é unânime a opinião, por exemplo, de que se há um programa de prevenção ao alcoolismo sendo implementado, em uma organização ou em uma comunidade, o desenvolvimento do hábito do consumo de bebidas alcoólicas tende a se reduzir e o nível de sucesso dos tratamentos em curso também tende a aumentar.
A IFALPA declarou recentemente que, no seu ponto de vista, é assim que a questão deve ser abordada, no caso dos pilotos. Para a Federação, qualquer tentativa de se tratar o assunto profissionalmente deverá se basear em programas de prevenção capazes de reconhecer precocemente uma tendência ao uso abusivo de substâncias problemáticas. E estes programas também devem abrigar disparadores de processos de intervenção, com a finalidade precípua de se interromper o desenvolvimento de hábitos inadequados ligados ao uso de drogas nocivas à saúde, lícitas ou não.
Com o rótulo de “solução” para esse problema surgiu, há alguns anos, o teste randômico de reconhecimento do uso de drogas. Entretanto, na opinião da IFALPA, este tão propalado teste aleatório de detecção de drogas e substâncias problemáticas não previne o seu uso, nem auxilia a abandoná-las os que já as utilizam, fazendo dele um instrumento carente de eficácia e distante de se tornar uma solução para a questão.
Esta é a razão pela qual a IFALPA é totalmente contra a aplicação desses testes em pilotos, sem que um programa de orientação e apoio aos usuários e de recuperação dos dependentes seja paralelamente desenvolvido. O teste, isoladamente, só serviria para estigmatizar pessoas as quais já estariam sob o jugo de uma patologia, ou seja, sem condições de discernir entre o bem e o mal para a sua saúde. Vale ressaltar que muitos dos acometidos por essa doença certamente teriam plena capacidade de abandonar o uso das drogas, sob supervisão de especialistas, o que lhes daria a condição de serem reconduzidos ao trabalho produtivo, com grande chance de sucesso.
Entretanto, caso este teste venha a ser aprovado pelas autoridades e utilizado pela Aviação Civil de algum país, a IFALPA advoga que, independente do resultado, este não seja um ato punitivo, mas, ao contrário, seja um identificador daqueles que necessitam de tratamento apropriado. Faz-se necessário enfatizar que o uso e a dependência de substâncias problemáticas devem ser classificados como patologias, as quais requerem diagnósticos e tratamentos supervisionados, além de programas de reabilitação com vistas à recondução ao ambiente de trabalho dos profissionais recuperados.
A IFALPA declara que a aplicação do teste para detecção de substâncias problemáticas deve restringir-se aos processos de:
· Seleção;
· Investigação de acidentes;
· Retorno ao trabalho após o cumprimento de um programa de reabilitação, e;
· “Razoável suspeita de uso”.
Quanto ao último processo abordado, o de “razoável suspeita de uso”, deve-se ter critérios e procedimentos formulados por especialistas em medicina (clínico-geral, psiquiatra, psicólogo e outros), a fim de se tornarem válidos, informativos, educativos e tão transparentes quanto requer uma questão sensível como esta.
Outra face do uso de drogas problemáticas, extremamente nefasta, é o hábito da automedicação. Até porque, este hábito pode ser proveniente de uma patologia conhecida como hipocondria, que é a mania de se sentir doente e, conseqüentemente, de se tomar como correto o consumo de remédios sem orientação médica.
A maioria dos profissionais de aviação que se automedicam desconhece totalmente os efeitos colaterais das drogas que utilizam. Isto os deixa vulneráveis o suficiente para perderem a agudez da percepção, a normalidade de atuação dos sentidos e a consciência situacional durante a operação aérea, situações que podem transformar a automedicação em fator contribuinte para um incidente ou um acidente aeronáutico, especialmente no caso dos pilotos.
Desde um “inocente” relaxante muscular aos anti-histamínicos, antigripais, ansiolíticos, barbitúricos, analgésicos opiácios e seus derivados, há uma legião de medicamentos que pode influenciar o desempenho humano, notadamente quando este requer atributos individuais ligados à cognição e às habilidades técnico-motoras apuradas, como é o caso das exigências encontradas na atividade específica do aviador.
Tenha sempre em mente que, da mesma forma que comandar aviões é tarefa para pilotos habilitados e qualificados, a prescrição de remédios é tarefa exclusiva de médicos detentores de registro no CRM. Por isto, rejeite a automedicação e seja um ativo agente propagador desta idéia.
Por fim, o objetivo deste artigo é auxiliar no trabalho de prevenção de incidentes e acidentes aeronáuticos, já que o combate ao uso de drogas problemáticas no ambiente de aviação deve ser uma obrigação de todos que a ela estão ligados.
Ajude, você também, a combater o uso de drogas e a automedicação. O SIPAER - Sistema de Investigação e Prevenção de Acidentes Aeronáuticos - agradece.